Histórico
O Clube dos Artistas Modernos - CAM é criado em 24 de novembro de 1932, um dia depois da fundação da Sociedade Pró - Arte Moderna - SPAM. As duas agremiações artísticas formadas na cidade de São Paulo expressam, antes de mais nada, o êxito do associativismo como estratégia de atuação dos artistas na vida cultural do país ao longo da década de 1930. E sinalizam uma atitude de independência em relação às instituições existentes no período, por exemplo, a Escola Nacional de Belas Artes - Enba. Tributários das conquistas estéticas do modernismo, os grupos dialogam de formas distintas com esse legado recente. A Spam, capitaneada por Lasar Segall (1891 - 1957), tem como principais integrantes as figuras do primeiro modernismo, parecendo filiar-se mais diretamente aos organizadores da Semana de Arte Moderna de 1922. O CAM, por sua vez, liderado por Flávio de Carvalho (1899 - 1973), se afirma pela marcação de distâncias em relação à Spam, tentando fazer valer um tom mais autônomo, mais irreverente e "menos elitista" em suas atividades e realizações. Como afirma provocativamente Flávio de Carvalho: "Detestamos elites; não temos sócios doadores".
O primeiro andar do edifício da rua Pedro Lessa, 2 - na parte baixa do viaduto Santa Ifigênia -, é escolhido como a sede social do clube, local onde se realizam festas, concertos, exposições e palestras, e se encontram uma biblioteca e um bar. Não por acaso no mesmo prédio funcionam também os ateliês de Antonio Gomide (1895 - 1967), Carlos Prado (1908 - 1992) e Di Cavalcanti (1897 - 1976), parceiros na aventura de criação do CAM. A idéia de constituição do grupo surge no salão de chá do antigo Mappin, na praça do Patriarca, centro da cidade, lembra o historiador Paulo Mendes de Almeida, onde estavam, além dele e de Flávio de Carvalho, Arnaldo Barbosa (1902 - 1981) e Vittorio Gobbis (1894 - 1968). O espírito da associação é promover intercâmbios entre diversas artes, estimular debates, divulgar novas criações e defender os interesses da classe artística. Do conjunto de suas realizações depreendem-se um forte engajamento político e social, simpatias em relação à experiência soviética e a crítica cerrada ao Estado e à Igreja brasileiros. Mas tudo isso regado a festas e diversão. O dia da inauguração do CAM evidencia o caráter festivo e teatral que marca os eventos da entidade. Antonio Gomide, Carlos Prado, Di Cavalcanti e Flávio de Carvalho pintam grandes painéis que decoram o salão. A cantora Nair Duarte Nuque traz um imenso bolo que é degustado entre gritos e cânticos. Enquanto isso, o compositor Frank Smith serve vodca com pimenta aos convidados, provenientes dos mais diferentes setores da vida artística e intelectual do país. Essa diversificação de público e propósitos marca as atividades do CAM: exposições de arte - entre elas, uma mostra gráfica da expressionista alemã Käthe Kollwitz (1867-1945), e outra de cartazes russos -; recitais de música erudita e popular - concertos de Camargo Guarnieri (1907 - 1993), Lavínia Viotti, Elsie Houston e Marcelo Tupinambá -; conferências - de Caio Prado Jr. (1907 - 1990) recém-chegado da então União Soviética, de Jorge Amado (1912 - 2001) sobre a vida nas fazendas de cacau, de Tarsila do Amaral (1886 - 1973), sobre arte proletária, do mexicano David A. Siqueiros (1896 - 1974) etc.
O CAM, essa "invulgar instituição" como quer P. M. de Almeida, funciona como um espaço de encontro e de manifestações culturais, com grande vocação crítica e anárquica. Vocação, aliás, característica das atuações de Flávio de Carvalho. O tom anticlerical e de crítica aos valores burgueses orienta a encenação do Bailado do Deus Morto, em novembro de 1933, no CAM, primeiro espetáculo ligado ao Teatro da Experiência, concebido por Flávio de Carvalho como amplo e variado laboratório de pesquisas. O espetáculo, espécie de teatro-dança, combina tendência expressionista, elementos da tragédia clássica e efeitos plásticos na montagem, colocando ênfase mais na ação cênica que no texto dramático. Os atores - Hugo Adami (1899 - 1999), Carmem Melo, os sambistas Risoleta e Henricão, Guilhermina Gainor e Dirce de Lima - encenam uma narrativa alegórica que tematiza as relações dos homens com seus deuses. Após três exibições da peça, o teatro é fechado pela polícia. A censura e as dificuldades financeiras levam ao encerramento das atividades do CAM, no fim de 1933, a despeito das manifestações de apoio que recebem de artistas e intelectuais expressivos no momento.
Postado por: Bárbara Teófilo
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